Em um dia marcado pelo clássico catalão entre Espanyol e FC Barcelona (finalizado em empate a dois gols), as jogadas mais destacadas foram feitas no Parlamento da Catalunha e no Congresso espanhol. Na câmara catalã, os deputados dos partidos independentistas (JxCat, CUP e ERC) apresentaram o seu total apoio a Quim Torra. Na sexta-feira, a Junta Eleitoral Central (JEC) espanhola determinou a inabilitação do presidente catalão.
Na capital da Espanha, ocorreu o debate sobre a investidura de Pedro Sánchez, que deverá esperar até terça-feira, 7 de janeiro, para ser investido. A posse do líder espanhol será possível graças, em grande medida, à abstenção dos membros do partido ERC no Congresso com base em um acordo que prevê uma mesa de negociação entre os governos catalão e espanhol.
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Parlamento da Catalunha: defesa inquestionável a Torra
Poucas novidades na sessão extraordinária convocada pelo presidente do Parlament de Catalunya, Roger Torrent. Os três partidos independentistas rechaçaram a determinação da JEC, e ratificaram Quim Torra como presidente catalão. Em seu discurso, Torra censurou a decisão do órgão administrativo espanhol, afirmando que “não aceitará a inabilitação, se assim quiser o Parlamento”. O líder da Generalitat de Catalunya prometeu ativar “todos os recursos necessários” e recorrer a “todas as instâncias jurídicas” para anular a inabilitação.
Sobre o contexto de repressão política por vias jurídicas, Torra instou os partidos da coalizão que governará a Espanha (PSOE e Podemos) a “efetivar o diálogo por meio do fim da repressão”. Em relação a Oriol Junqueras, também inabilitado pela JEC como eurodeputado, o presidente catalão disse que a decisão “é um escândalo europeu de grandes proporções”, e que a imagem da Espanha, hoje, “está no chão”.
A seguir, um resumo do discurso dos líderes de partido na Câmara:
Lorena Roldán, de Ciudadanos, iniciou sua intervenção com um “Boa tarde, honorável ex-presidente, senhor Torra”. A porta-voz do partido unionista acusou o movimento independentista de “apropriar-se da Catalunha”, e repreendeu Miquel Iceta (PSC) pelo fato de o futuro governo espanhol “depender dos partidos independentistas”.
Miquel Iceta, do PSC, disse que a inabilitação de Torra poderia, somente, “ser oriunda de uma firme decisão da Justiça, não da JEC”. O líder socialista no Parlament de Catalunya se mostrou a favor de que a Câmara “interponha um recurso em defesa das instituições catalãs”, e sugeriu a Quim Torra “uma defesa jurídica que não utilize a decisão da JEC como instrumento de confronto”.
De acordo com Alejandro Fernández, do PP, “o presidente Quim Torra consegue ser pior que Carles Puigdemont”. Ambos foram descritos por Fernández como “pragas bíblicas”.
Marta Vilalta, de ERC, disse que a Catalunha “vive em uma anormalidade democrática”, e que os poderes do Estado espanhol querem “voltar a decidir o futuro da presidência catalã”. A decisão da JEC foi descrita por Vilalta como uma “aberração antidemocrática surrealista”, e caracterizada como “mais um ataque contra o independentismo e a soberania do Parlamento da Catalunha”.
Por sua vez, Carles Riera, da CUP, disse que “a maioria das forças políticas trancou as janelas de oportunidades abertas pelo povo”. Sobre a autodeterminação, Riera se mostrou convencido de que ela não pode ser negociada: “Os direitos são conquistados. Não se negocia a autodeterminação, não se negocia a anistia”.
Congresso espanhol: sim ao diálogo sobre conflito político… mas no marco da Constituição
Em seu discurso e réplicas aos deputados, Pedro Sánchez reconheceu a existência de um “conflito político”, deixando, assim, de voltar a falar sobre “problemas de convivência na sociedade catalã”. Entretanto, o líder do PSOE, mais uma vez, limitou o diálogo ao marco constitucional espanhol: “Todos sabemos que é preciso dialogar, e isso deve partir do reconhecimento ao outro e suas razões, mas dentro da lei”.
Respondendo a Gabriel Rufián, deputado do partido ERC, que havia dito que “se não houvesse mesa de negociação, não haveria legislatura”, Pedro Sánchez garantiu que as negociações serão estabelecidas, “com firmeza e honestidade”. Sánchez também argumentou que “sempre” se referiu ao conflito político como tal, mas afirmou que “a autodeterminação não está amparada pela legislação internacional”.
A seguir, um resumo das declarações realizadas no Congresso espanhol:
Para Inés Arrimadas, de Ciudadanos, Pedro Sánchez “apenas pensa na investidura, e não tem a menor ideia de como aprovará as leis”. Além disso, lamentou que Sánchez “passe a depender, de forma recorrente, do apoio de partidos independentistas e nacionalistas”. Na réplica, o líder do PSOE disse que Arrimadas “escutou mais a extrema direita do que os seus próprios eleitores”. Por último, Sánchez convidou Arrimadas a “abandonar a coalizão do apocalipse”, em referência à união entre Ciudadanos, PP e VOX.
Laura Borràs, de JxCat (Junts per Catalunya), perguntou a Pedro Sánchez se não era “contraditório defender o diálogo e inabilitar um dos interlocutores”, e relembrou ao socialista que “80% dos catalães defendem um referendo”. Sánchez afirmou que “o PSOE é dialogante”, e se mostrou disposto a “reconhecer que o governo e o Estado espanhol cometeram erros”. Na mesma linha, perguntou a Laura Borràs se “os independentistas não haviam cometido erros também”, em especial referência à declaração unilateral de independência feita por Carles Puigdemont. A deputada catalã disse que “foi o Estado espanhol que aplicou a unilateralidade”, e que sempre que as urnas estiveram presentes, “o independentismo saiu ganhando”. Finalmente, Borràs instou PSOE e Podemos a “acabar com a repressão”.
Pablo Casado, do PP (Partido Popular), não variou seu discurso sobre a Catalunha, um de seus temas mais recorrentes, e meios de ataque a Pedro Sánchez. Em relação a Quim Torra, o representante do PP exigiu a Sánchez “o envio de um requerimento ao presidente catalão para que abandone a Generalitat de Catalunya” e que, se houver desobediência, “que aplique o Artigo 155 na Catalunha”. Em sua intervenção, Pablo Casado não poupou desqualificativos em suas declarações contra Sánchez, a quem chamou de “sociopata, mentiroso, patético, arrogante e presidente de mentira”. Por sua vez, Pedro Sánchez censurou o discurso de Casado, descrito como “à altura do que diria Santiago Abascal”, líder do partido da extrema-direita VOX.
Santiago Abascal exigiu que o presidente da Catalunha “seja preso”, e seguindo (ou superando) o discurso de Pablo Casado, afirmou que o debate parlamentar deste sábado foi “um ato de investidura clandestina, uma traição natalina e uma emboscada para a Constituição”. Abascal, que prometeu ativar “todos os recursos para derrubar o futuro governo”, quis saber, de maneira insistente, sobre o porquê de Pedro Sánchez “ter enganado o povo espanhol dizendo que não pactaria nem com Podemos e nem com os ‘separatistas'”. O líder do PSOE respondeu que “a atual composição da Câmara foi a que os espanhóis escolheram por meio do voto”, e que “a democracia espanhola é tão grande que até eles (deputados de VOX) cabem”.