Quem é Josep Borrell? Arquivo Doc.cat Aqui Catalunha

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Quem é Josep Borrell? Essa é a pergunta da publicação que inaugura o doc.cat, a mais nova seção de matérias do Aqui Catalunha. Trata-se de um espaço em que serão abordados temas, pessoas e lugares de importância capital para o entendimento sobre a Catalunha atual e histórica. Para essa estreia, propomos uma análise sobre um dos homens mais comentados na Catalunha, no Estado espanhol e na Europa atuais. O objetivo será trazer a tona, para os leitores de língua portuguesa, as declarações do até então Ministro de Relações Exteriores do governo espanhol, e provável novo chefe da diplomacia da União Europeia, sobre o processo independentista catalão e a própria história espanhola. Desentendimentos com diplomatas europeus e jornalistas marcaram os últimos doze meses de Josep Borrell.

Borrell: carreira e a “ferida na sociedade catalã”

Borrell nasceu no município de La Pobla de Segur, na província catalã de Lleida, em 1947. A maior parte de seus estudos acadêmicos foi cursada na capital espanhola (para onde se mudou em 1965) na Universidad Complutense de Madrid, onde estudou Engenharia Industrial e Ciências Econômicas. Ampliou sua formação acadêmica na França e nos Estados Unidos. Em relação à vida política, Josep Borrell sempre esteve ligado ao PSOE, o Partido Socialista Obrero Español, ao qual se afiliou em 1974. Entre os altos cargos políticos assumidos no âmbito espanhol e no âmbito europeu, estão o de Ministro de Obras Públicas e Urbanismo, Ministro de Meio Ambiente, Presidente do Parlamento Europeu e Ministro de Relações Exteriores.

O catalão foi escolhido para o cargo diplomático em junho de 2018, passando a integrar o novo governo espanhol, liderado por Pedro Sánchez (PSOE), após a moção de censura contra Mariano Rajoy. Antes de sua eleição para o posto, Borrell já havia feito críticas contundentes e desrespeitosas ao processo de independência da Catalunha. Durante a campanha para as eleições na Catalunha em 21 de dezembro de 2017, Borrell, que apoiava a candidatura de Miquel Iceta (PSC) à presidência da Generalitat de Catalunya, disse o seguinte, sobre o movimento independentista, especialmente sobre os meses após a realização do referendo de autodeterminação:

“Esta é uma sociedade ferida, e é preciso curá-la. Mas antes de fechar as feridas, é necessário que sejam desinfetadas. Porque… se são costuradas sem terem sido desinfetadas, apodrecem. É preciso sanar o corpo social e, para isso, é preciso passar bem um desinfetante e, depois, costurar” (assista ao vídeo)

Uma conversa difícil com a BBC

Em setembro de 2018, Borrell foi entrevistado por Stephen Sackur, jornalista que conduz o programa Hardtalk, da BBC. Um dos temas da entrevista foi o atual conflito político entre Catalunha e Espanha, mais especificamente sobre a autodeterminação e os líderes independentistas catalães. Em alguns momentos, Borrell tem dificuldades para contra-argumentar as palavras do entrevistador, e nega que exista um amparo internacional em forma de lei que favoreça a autodeterminação catalã:

  • Stephen Sackur (SS): “Deixe que lhe faça uma pergunta bem simples. O senhor considera a Catalunha uma região ou uma nação?”
  • Josep Borrell (JB): “Uma nação”
  • SS: “Uma nação. Bem claro.”
  • JB: “Ah”
  • SS: “E o senhor também reconhece, creio, como a Espanha reconheceu em um tratado da ONU, e assinou, o senhor reconhece o direito dos povos à autodeterminação. Então se o senhor reconhece esse direito, e o senhor reconhece que a Catalunha, de fato, é uma nação, então me custa entender como ao povo catalão lhe é negado um referendo sobre o direito dele à autodeterminação”.
  • JB: “Vamos, de novo, usar as palavras corretas. Não é autodeterminação, é secessão. Primeiro, a Constituição espanhola não permite. Há uma sentença do Tribunal Constitucional que diz claramente que você pode perguntar sobre a secessão, você pode perguntar sobre a secessão. Mas toda pergunta que você quiser fazer sobre o tema tem que ser feita no marco de uma mudança constitucional. Segundo, não há nada na lei internacional que dê à Catalunha o direito à secessão”.
  • SS: “Bom, há alguns advogados que não estão de acordo com o que o senhor diz… Mas de alguma maneira, isso é mais uma questão de política do que de uma leitura detalhada da lei. O que o senhor acha que isso diz…”
  • JB: “A leitura detalhada da lei é muito importante”.
  • SS: “Concordo com o senhor, é importante, mas a política também. Como o senhor pode explicar que na Espanha, hoje, em suas prisões, haja 9 ativistas, políticos catalães que, pelo visto, serão julgados por acusações de rebelião e sedição em outubro. O que isso diz sobre a Espanha para a comunidade internacional? Porque, francamente, o julgamento parece uma farsa”. (vídeo 1)
  • JB: “Eu, pessoalmente, preferiria que estivessem em liberdade condicional. Acho que há outras maneiras de impedir que fujam”.
  • SS: “Então, por que… voltando para a pergunta básica” / JB: “É a minha opinião pessoal”
  • SS: “Seu governo, em sua responsabilidade de encontrar novas formas de resolver a crise catalã… Por que o seu governo não os indulta, não diz às autoridades que essas pessoas terão um indulto, e que devem ser soltas agora. E depois, começar a conversar com eles”.
  • JB: “Já ouviu falar sobre separação de poderes? Na Espanha, há separação de poderes. É o juiz que tem que tomar essa decisão, o governo não tem nada a ver com isso.”
  • SS: “Então o senhor verá o julgamento acontecendo, verá que Carles Puigdemont ficará em Bruxelas ou Alemanha, onde ele decidir… Com o seu governo desesperadamente buscando a extradição e sendo rechaçada pelos tribunais alemães… A percepção internacional da Espanha será que é um país que simplesmente não consegue aceitar o desejo, do que o senhor chama de nação, dentro do seu Estado, de votar sobre seu próprio futuro.”
  • JB: “De novo… Catalunha está dividida em duas partes. Não fale sobre a Catalunha como se fosse algo homogêneo. Entende? ‘A Catalunha quer’, ‘Falo em nome da Catalunha’. 47% dos cidadãos votaram a favor da independência. Nem a metade é”.
  • SS: “Ministro, dê a eles um referendo autorizado, aceito por Madrid e, então, veremos. Se o senhor estiver certo, então, logicamente, a secessão não vai acontecer”. (vídeo 2)

Borrell fala sobre a independência dos Estados Unidos e a matança de “apenas quatro índios”

Em novembro de 2018, durante um encontro com universitários na Universidad Complutense de Madrid, o Ministro de Relações Exteriores espanhol falou sobre o futuro da Europa. Borrell, em sua comparação entre a integração política na União Europeia e a unidade nos Estados Unidos, afirmou o seguinte:

“Nós temos muita história por trás… Mas por que os EUA tem um maior nível de integração política? Primeiro, porque todos têm o mesmo idioma. E, segundo, porque tem muito pouca história por trás. Nasceram de uma independência praticamente sem história. A única coisa que fizeram foi matar quatro índios. Mas fora isso… foi muito fácil. (vídeo)

No Twitter, o secretário do partido Podemos, Pablo Echenique, comentou as palavras de Borrell: “O Ministro de Relações Exteriores do meu país, se referindo ao extermínio sistemático de povos indígenas nos Estados Unidos. De vergonha em vergonha”.

Borrell e a zona de conflito em televisão da Alemanha

Em março deste ano, Josep Borrell foi entrevistado no programa Conflict Zone, da rede de televisão alemã Deutsche Welle. O Ministro, porém, não gostou das perguntas feitas pelo renomado jornalista Tim Sebastian, e afirmou que elas eram “tendenciosas”. Por duas vezes, Borrell quis que a entrevista fosse encerrada. Na segunda, ele conseguiu. Confiram a transcrição feita pelo Aqui Catalunha em 29 de março.

Borrell diz que o secretário de Relações Exteriores da Catalunha “não tem senso de ridículo”

O provável novo responsável pela diplomacia da União Europeia criticou Alfred Bosch, secretário de Relações Exteriores do governo da Catalunha, por sua opinião sobre a colonização espanhola no México. Durante sua viagem oficial ao país, onde anunciou a abertura de uma embaixada catalã na capital mexicana, Bosch pediu desculpas “pelos abusos e matanças cometidas pelos espanhóis contra os povos nativos durante o processo de conquista”, entre 1519 e 1521. A intervenção de Bosch, porém, deixou Josep Borrell contrariado: “Não tem senso de ridículo”. O secretário do governo catalão respondeu, em seu Twitter: “Rídiculo, @JosepBorrellF, é não reconhecer e assumir o próprio passado, como fazem os países avançados. Menos qualificativos e mais desculpar-se”.

Ataque a senadores franceses e o movimento #StopBorrell

Em março deste ano, 41 senadores franceses assinaram um manifesto pela defesa da democracia e a prisão preventiva de líderes políticos catalães. Borrell, por sua vez, afirmou que “o nível de desinformação desses senadores sobre a Catalunha e a ‘realidade espanhola’ é alarmante”.

Nesta semana, Josep Borrell foi indicado para ser o novo líder da diplomacia europeia. A reação contra a nomeação de Borrell para o cargo gerou forte repercussão e muitas reações negativas. Uma delas foi a do advogado britânico Ben Emmerson, que disse, em seu Twitter: “A candidatura de Borrell como líder da política exterior da União Europeia é completamente inapropriada. Prejudicará seriamente a União Europeia, e no ano passado, foi multado por uso indevido de informação privilegiada. Nem consegue agir com cortesia em uma entrevista. #StopBorrell”.

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