Sociólogo afirma que a Catalunha está em uma “situação colonial”

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Em entrevista concedida ao portal de notícias catalão Vilaweb, o sociólogo porto-riquenho Ramón Grosfoguel afirma que a Catalunha está em uma “situação colonial”. Grosfoguel é professor adjunto da Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos, e é especialista em estudos sobre descolonização e racismo.

Grosfoguel: “Colombo foi um genocida”

Vilaweb: “Sobre os ataques às estátuas de Cristóvão Colombo, o que acha?

Grosfoguel: “Ele foi um grande genocida, um grande colonizador. E não podemos desvincular a colonização das Américas do genocídio, e a destruição de civilizações ou do fascismo. Não dá para entender o nazismo, por exemplo, sem o colonialismo. Hitler seguia os métodos dos europeus na África, na América Latina e na Ásia.

Vilaweb: “Espanha, projeto imperialista. Essa é uma das sua críticas.

Grosfoguel: “Espanha continua sendo um projeto imperialista. É uma grande invenção. A Espanha como nação jamais existiu. Há castelhanos, catalães, bascos, andaluzes… Mas Espanha? Tem origem imperial, na conquista de Al-Andalus, e das Américas. Olhem Franco, por exemplo: a guerra civil espanhola nada mais é, em muitos sentidos, que o conjunto de métodos de colonização usados no norte da África. Dez anos antes da Guerra Civil, Franco já cometia barbaridades no Marrocos. E levou o mesmo exército para a Península Ibérica. Por isso, víamos cenas como aquelas: policiais atacando pessoas como se elas fossem touros.

"O povo manda, o governo obedece"
“O povo manda, o governo obedece” – Imagem por fotomovimiento.org

Sobre a política na Catalunha e na Espanha

Vilaweb: “Como você enxerga a política catalã e espanhola da atualidade?

Grosfoguel: “O Estado espanhol é mais centralista, de direita, neoliberal, que impõe o sufocamento econômico… É um desastre. E vem uma grande depressão. Se vocês se lembram bem, o independentismo [catalão] cresceu em 2008-2009, com a crise econômica. Eu diria que, neste momento, a situação em que estamos entrando é ainda pior que a de 2008-2009, porque não será uma recessão temporária. Vem uma grande depressão. As condições atuais favorecem a ação do movimento soberanista. Há um povo preparado para lutar, batalhar, mas falta uma liderança. A crise está na liderança, especialmente em relação aos partidos, que não estão à altura do momento.

Há duas tendências no movimento catalão: o “junquerisme* e o “cuixartisme*. Quando falo de “junquerisme“, me refiro a uma ideologia de rendição diante do Estado [espanhol], que quer enterrar o Primeiro de Outubro, que quer administrar a colônia por mais uns quinze ou vinte anos.

Os defensores do “cuixartisme“, por outro lado, mantém viva a chama do Primeiro de Outubro. Há “cuixartistes” dentro de cada organização: na CUP, infelizmente, e nestes momentos, creio que são minoria; na ERC, também em minoria; em JxCat, em minoria ou empate com os “junqueristes”. Há uma grande divisão. O único líder que se posiciona ao lado dos “cuixartistes” é Carles Puigdemont.

Nestes momentos, é prioritário um fronte de salvação nacional catalão. Talvez JxCat (Junts per Catalunya) seja esse projeto. Uma iniciativa da sociedade civil com o objetivo de criar um fronte de salvação nacional catalanista é prioritário, e cada vez mais necessário. A crise será mais profunda, e o que a Espanha oferece à Catalunha é o horror. Se o PSOE (Partido Socialista Obrero Español) é o mais progressista, imagine o que vem atrás.

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Para o independentismo catalão, "Catalunha não é Espanha"
Para o independentismo catalão, “Catalunha não é Espanha” – Imagem por SBA73

Sobre as esquerdas e direitas, o independentismo e o colonialismo

Grosfoguel: “Na Catalunha, o conceito de esquerda e direita fracassa. Não serve para entender o processo [independentista] catalão, mas é adotado pela esquerda espanholista, que adora esses termos.

Dizem que Puigdemont é de direita, e não pode ter apoio. Perdoem-me, mas Puigdemont é mais de esquerda que, por exemplo, Ada Colau. No contexto catalão, Ada Colau é de direita. O que ela fez para ser prefeita de Barcelona? Pactar com Valls e Ciutadans! Tudo para evitar que ERC, um partido independentista, governasse Barcelona. Mais de direita, impossível.

Vilaweb: “Sejamos críticos com os “cuixartistes”. O Tsunami Democrático tampouco durou muito. ANC e Òmnium, você as vê fortes? Podemos criticar os “junqueristas”, mas e os “cuixartistes”?

Grosfoguel: “As coisas não foram bem feitas. Quando surgiu o Tsunami Democrático, os atos de desobediência civil foram multitudinários, mas começaram a reduzir quando viram que ERC aceitou uma mesa de diálogo com o governo espanhol. Houve uma divisão entre os “cuixartistes”, e muita gente se sentiu desmobilizada. A luta devia ter continuado, não pode ser interrompida. Muita gente pensou: “Vou me arriscar para que eles discutam quem vai administrar a colônia? Vendo-os trair o espírito do Primeiro de Outubro, e arriscar a minha vida?”. É por isso que deve haver um fronte de salvação nacional. Ou a Catalunha e os catalães criam um fronte que leve adiante a luta soberanista, ou se afundará com a Espanha. O que está por vir é uma grande depressão, e uma grande virada para a direita na política espanhola, a ascensão do fascismo, e uma esquerda espanholista que não entende nada. Ou os catalães se organizam por si sós para se salvarem, ou afundarão com a Espanha. Mas é preciso que se reativem, porque é um povo preparado para tomar as ruas.

Vilaweb: “Você passou a pandemia na Califórnia?

Grosfoguel: “Sim, em casa, em San Francisco. Sou professor da Universidade de Berkeley, e estou dando aulas pela Internet. Sou professor de descolonização e, por isso, me interessa o tema catalão. Não deixa de ser um tema importante sob o ponto de vista da descolonização. Vejo o processo de liberação nacional catalã como um processo de descolonização, e que pode ajudar outras lutas no mundo.

Vilaweb: “Colônia? “Catalunha é uma região”, algumas pessoas vão te dizer isso

Grosfoguel: “Catalunha não tem poder soberano no seu âmbito político. Está sob o domínio de um Estado imperialista. Não tem soberania fiscal, de fronteiras, de nada. É uma nação sem Estado sujeito ao que é decidido em Madri. Isso é colonialismo. Não é necessário que haja uma administração clássica colonial. A colônia é definida por uma relação de dominação de um Estado imperialista sobre outros povos. Vejam o exemplo da pandemia: Madrid decidiu liquidar a autonomia da Catalunha. Não havia soberania em lugar algum. É por isso que falo de colônia. Sei que muita gente fica chocada, mas é preciso dizer as coisas pelo seu devido nome. Até mesmo no soberanismo catalão é difícil usar esses termos. Vocês [catalães] estão diante de um Estado que os abate. Vocês estão em uma situação colonial. E, ao mesmo tempo, em um processo de liberação. Volto a dizer: ou vocês criam um fronte de salvação nacional, ou afundarão com a Espanha.”

Texto original, publicado em 6 de julho de 2020: https://www.vilaweb.cat/noticies/grosfoguel-catalans-situacio-colonial/

Traduções para o catalão, o inglês e o espanhol

Esta notícia foi traduzida, de forma automática, para as línguas catalã, inglesa e espanhola.

* junquerisme: termo em catalão referente a Oriol Junqueras (partido ERC), que foi vice-presidente na anterior legistatura.

* cuixartisme: termo em catalão referente a Jordi Cuixart, atual presidente da Òmnium Cultural.

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