Teremos investidura

    O tempo está se esgotando e hoje é o último dia para se formar governo na Catalunha, passados os três meses regulamentares da eleição em que a coligação independentista saiu vitoriosa, no dia 21 de dezembro passado. E porque não se formou governo até agora? Ah… esse é outro problema. O povo catalão tem uma paciência e uma perseverança que não há escala que as meça. Sabem que antes da aplicação do Art. 155 já estavam sob intervenção branca, Madrid nunca os deixará em paz e eles estão cientes disso; por essa razão não tem pressa nenhuma, mas não desistem de sua independência. Apenas irritam os “contras” com estratégias que via de regra os fulmina, muitas vezes através de infartos na vida real dos atores.

    Assim durante os últimos três meses, dia sim dia não, iam aparecendo os candidatos ao posto maior da Generalitat em balões de ensaio que ensejavam “Puigdemont será investido por via Telemática” e tome botar o TC (Tribunal Constitucional) a trabalhar sábados e domingos para encontrar um casuísmo aplicável à uma negativa preestabelecida; ou então “Jordi Sànchez, número dois que está preso, será investido” e, haja malabarismo dos constitucionalistas para impedi-lo de assumir o comando do Govern, porquanto não está condenado, apenas indiciado por razões políticas, ao que se diz, infundadas. Neste momento, 11 h:07min, está Sànchez numa audiência sentado frente ao TS (Tribunal Supremo, outra corte) esperando ser liberado provisoriamente da cadeia, o que lhe permitirá a investidura. Possibilidade bem próxima a zero.

    Mas em paralelo, o Parlament catalão segue com sua jornada que enerva ainda mais a Madrid… estará votando possivelmente hoje, ou fazendo de conta, uma lei que permite a investidura telemática do presidente da Generalitat, o que garantiria a eleição de Puigdemont. Entenderam? Duas frentes abertas que põem à beira de um ataque de nervos a plutocracia espanhola. Não, não é só isso caros leitores, há uma terceira via, essa mais próxima da realidade e não menos irritante para a Moncloa. Jordi Turull será investido brevemente. Nada pode frear a investidura dele pois é deputado e está livre. Estava preso até recentemente porque era o porta voz do independentismo e quiçá era uma das figuras que mais irritava os constitucionalistas. Deram bobeira e o liberaram da cadeia, não imaginavam que o mesmo alçaria o patamar para a investidura e agora vão ter que engolir o homem. Ou então um dos outros dois, o que seria uma derrota ainda maior. Ah… esses catalães são finos na arte de espetar as almas penadas dos unionistas. Séculos seguidos de bombardeios e perseguições os há plasmado com a frieza daqueles que tem só como aliados a esperança, fazendo-os perceber que o sangue quente dos espanhóis empurra o governo central para a contramão da comunidade europeia ao reeditar o fascismo disfarçado de uma legalidade de pernas curtíssimas que não será validada pelo tribunal de Estrasburgo.

    Essa é a revanche possível que dispõem os catalães, porque do ponto de vista econômico já foram rifados. A comunidade autonômica de Madrid em combinação com o governo central criou as condições para que em torno de 3.000 empresas fossem transferidas da Catalunha, ainda que isso esteja gerando insatisfação em outras comunidades afetadas pelo mesmo incentivo. Porem a realidade nua e crua é que isso não tem volta, dizem os especialistas. Tem mais: a Catalunha formava metade dos esportistas da Espanha com base numa lei que permitia aos treinadores que já tinham um emprego poder trabalhar numa segunda atividade formadora de atletas sem a necessidade de recolher para a seguridade social. O governo central detonou isso e o resultado é que a Espanha vai perder, mas a Catalunha perderá muito mais pois é uma referência na Europa na formação de atletas. Barcelona estava prontíssima para ser o grande porto do mediterrâneo porque é de fato a única grande cidade europeia situada à beira-mar com capital econômico e cultural de dimensões mundiais. Mas Madrid criou um porto seco (isso mesmo) e com o apoio das UE está tomando o posto. Pura retaliação… porque o certo é que porto seco não recebe navio algum com boa carga, mas os investimentos irão a Madrid. Assim veremos o que passará até a semana santa. O governo central parece já ter se convencido de que não há mais forma “legal” de manter o 155, o embuste perdeu força, mas a farsa da justiça segue. O juiz Pablo Llarena para vetar a investidura de Jordi Sànchez à presidência da Generalitat recorre ao caso de um assassino francês Thierry Delvigne, a quem se lhe negou o direito de voto depois de 12 anos de cadeia, um caso que, segundo os advogados de Sànchez, “não tem absolutamente nada a ver” com a causa contra o independentismo. Também em resolução de 29 de Janeiro ao negar aos deputados presos uma permissão para poder assistir à investidura de Carles Puigdemont, o juiz da Corte Suprem torna a citar o caso Delvigne como se fosse de direitos humanos quando há jurisprudência firmada pelo TEDH sobre o caso. É a paciência de uns contra o desespero dos outros, mas que haverá investidura não se tem dúvida…

    _ Texto de Manoel Lucas

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