O som do hino espanhol, sem letra, foi um dos elementos que abriram a conferência de Carles Puigdemont, realizada no dia 31 de maio, e organizada pela Cambridge University Catalan Society. Para o atual representante da Catalunha no Parlamento europeu, o exílio lhes permite “continuar explicando o processo independentista catalão“. Um exílio com seus pontos baixos e suas oportunidades.
Os primeiros minutos da conferência foram marcados pela apresentação e explicações do moderador Pau Figueras. Após passar a palavra ao protagonista do evento, soou a Marcha Real espanhola. De alguma forma, alguém conseguiu acesso à conferência. Confiram a seguir.
Após a ação imprevista, Puigdemont disse: “Quando alguém usa o hino de seu país como ato de agressão ou ofensa a outro, quer dizer que esse país não te representa”. Não é a primeira vez que o 130º Presidente da história da Catalunha passa por momentos como esse. Há poucas semanas, o líder catalão denunciou o roubo da placa da fachada da Casa da República, sede da entidade dirigida por ele, o Conselho pela República Catalã. Dias depois, porém, em um ato de “arrependimento” o autor do delito compareceu ao local de trabalho e residência de Carles Puigdemont, com a placa em mãos e uma carta com o pedido de desculpa.
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A apresentação de Puigdemont voltaria a ser interrompida minutos depois, com gritos que exaltavam a Espanha. Desde o início de seu exílio, Puigdemont sabe o que é receber contínuas ameaças contra a sua integridade física e outras desqualificações pessoais. Com a resiliência de alguém que teve um helicóptero sobrevoando sua casa no dia da realização do referendo de autodeterminação catalã (1º de outubro de 2017, detalhado em um de seus livros lançados em 2020), o atual eurodeputado explicou a escolha feita pelo exílio. Para Puigdemont, além de “lhe permitir continuar explicando o processo independentista da Catalunha”, o exílio é uma maneira de ter seus direitos “respeitados” na Europa, diferentemente do que ocorreu no Estado espanhol.
Em meio à enxurrada de comentários dos espectadores, o líder catalão se referiu à Bélgica como o “foco político europeu”, e isso explica o exílio em território belga. Por outro lado, Puigdemont explicou que, como exilado, suas condições de vida e como político não são as mesmas. Além disso, revelou as dificuldades de lidar com “as manipulações da imprensa”, e considerou a imprensa espanhola uma “máquina muito poderosa”. Ainda de modo bastante aberto, franco e sincero, Puigdemont comentou sobre as ameaças vividas no exílio, os momentos de incerteza, a “perseguição judicial“e a atuação dos serviços secretos. A título de desabafo, Puigdemont falou sobre a “falta de compreensão” que existe em relação aos exilados catalães. Por outro lado, o eurodeputado disse que o exílio, ao contrário da prisão, possibilita a “liberdade de movimento e de expressão na Europa“.
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Estratégias de ação e prioridades para a causa catalã
Em relação ao seu papel (e a dos demais exilados), Puigdemont afirmou que as prioridades são “continuar explicando ao mundo a causa catalã” e “ampliar o conhecimento sobre ela”, considerado “deficitário” há até pouco tempo. Nesse sentido, explicou que, a fim de internacionalizar a causa catalã, participa de entrevistas, conferências e outros atos públicos. Essa é uma das estratégias de ação dos exilados políticos catalães.
A segunda estratégia, de acordo com Puigdemont, é “denunciar o Estado espanhol”. Mais especificamente, essa denúncia ocorre por meio do “desmascaramento do Estado espanhol como democracia”, descrito como um “problema para a democracia europeia”. Assim, Puigdemont disse que, até o momento, “conseguiram demonstrar com feitos as ações espanholas” contra o independentismo catalão.
Como terceira estratégia, Puigdemont aposta no “combate à máquina propagandística espanhola“, considerada por ele como “poderosíssima”. Por último, o líder catalão enfatizou a estratégia judicial, que aproveita a “fúria” jurídica espanhola na perseguição aos exilados catalães.
Vale a pena comentar, antes de avançar nesta crônica, que tanto Puigdemont como os eurodeputados Toni Comín e Clara Ponsatí tiveram sua imunidade parlamentar recuperada na semana passada, ainda que de maneira provisória.
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Os últimos vinte minutos da conferência foram de perguntas feitas pelos espectadores. Quando perguntado sobre a chamada “Mesa de Diálogo” entre os governos catalão e espanhol, Puigdemont disse que “cabe mudar as condições para que essa “Mesa de Diálogo” seja, de fato, uma “Mesa de Negociação”.
Sobre os possíveis indultos concedidos pelo governo espanhol aos líderes independentistas catalães, Puigdemont negou que o Estado espanhol planeje fazer isso para “ajudar”. Além disso, o líder catalão afirmou que, embora os indultos tenham alguns “pontos positivos” (defendidos, também, por Pere Aragonès), “não resolvem o problema”, em referência ao conflito político.
Em relação a uma possível desobediência institucional catalã, Puigdemont disse que o confronto deve ser preparado “fora dos limites das entidades institucionais” na Catalunha, destacando, assim, o papel dos cidadãos e do Conselho pela República Catalã, entidade privada sediada em Waterloo, Bélgica. Acima de tudo, Puigdemont voltou a reforçar a importância da “unidade” entre as forças independentistas, e valorizou a difusão no exterior do papel desempenhado pelos exilados políticos catalães: “ajuda a contrastar informações”, garantiu Carles Puigdemont.